Artigo: "Oratória no Júri"

 Por Felipe Azuma
 Postado em 31/08/2021

Atributos que diferenciam um simples falador de um verdadeiro tribuno




O processo penal no âmbito do júri é essencialmente discursivo. E nós, como profissionais do direito (e aqui me refiro diretamente aos tribunos), estamos reiteradamente ouvindo frases envolvendo a oratória no júri, entre elas: “O promotor/defensor fez um discurso emocionante”, “A defesa/acusação foi melhor no debate”, “Não senti confiança no que ouvi”, “pela performance da acusação o réu deve ser condenado” ou “A defesa foi melhor e conseguiu se conectar com os jurados, o réu deve ser absolvido” etc.




Isso se dá porque a linguagem predominante no plenário é a oral. Portanto, é comum ouvirmos opiniões variadas quanto a qualidade da oratória das partes e como isso influenciará no acolhimento da tese escolhida e apresentada aos jurados. Assim, além dos elementos de informações levados aos jurados, a forma como são conduzidos e expostos se torna um fator preponderante para o debate em plenário. Muitos se aventuram e vão ao plenário sem conhecer os requisitos mínimos que diferenciam um verdadeiro tribuno de um simples falador.




Nessa senda, é preciso muito mais que atuações em sessões de julgamento para se tornar essencialmente um orador de excelência. Saber falar muitos advogados sabem. A diferença entre um tribuno de sucesso e um simples “falador” está exatamente aqui. Poucos possuem o condão de estimular sentidos e despertar sentimentos. Tocar de fato, a alma dos jurados. Evitar bloqueios, conectar-se com eles de maneira exímia, para que o resultado almejado por ele seja acatado. O simples falador vai para o júri, sem qualquer preparo mais profundo, achando que basta chegar ali e falar algumas palavras com um “juridiquês” que estará tudo resolvido.




O verdadeiro tribuno passa por momentos de tensão antes do júri e como qualquer ser humano, tem episódios de nervosismo. No entanto, ele não deixa que a pressão do momento o sufoque e o impeça de passar sua mensagem. O verdadeiro tribuno deve saber dominar a apreensão que sente antes de entrar no plenário.




Ademais, existem algumas particularidades que devem ser trabalhadas pelo advogado criminalista se ele deseja de fato, ser um tribuno de sucesso. São atributos subjetivos e objetivos que devem ser lapidados no decorrer de sua experiência profissional e pessoal, quais sejam:




Talento: O tribuno se mostra talentoso quando sabe argumentar de maneira clara e inteligente. Ele sabe relacionar detalhes do caso concreto com o cotidiano dos jurados, facilitando com que eles se identifiquem com a causa e consigam se colocar no lugar do outro através de exemplos práticos e envolventes. Para isso, ele deve conhecer os jurados. É como um relacionamento, quanto maior a intimidade, mais propriedade você tem de falar sobre aquela pessoa, mais domínio você tem sobre a maneira de agir, pensar e se portar de determinado indivíduo perante a sociedade. Ele também se mostra talentoso quando usa de sua boa memória a favor da causa que está defendendo.




Imaginação: Esse atributo é acessório do anterior. Quando o tribuno trabalha sua imaginação, ele consequentemente se tornar mais talentoso e apto a realizar de maneira excepcional as mais lindas comparações. Elas são perfeitamente encaixadas no discurso, de forma natural, sem esforços. A imaginação é lapidada com muito estudo e leituras essenciais que todo tribuno deve conhecer. Ele deve ler poesia, história, filosofia para ter uma boa imaginação. Considerando que somos sujeitos afetivos, simples palavras se tornarão um mundo no qual os jurados irão penetrar com toda a sensibilidade necessária para que sua tese, tenha mais chances de ser acolhida. Seja um ótimo contador de histórias, é o que os profissionais do marketing digital chamam de storytelling.




Sensibilidade: O procedimento do tribunal do júri é intenso. E a intensidade da defesa deve ser proporcional à intensidade da acusação. Para ser intenso, você precisa ser sensível, são atributos diretamente ligados entre si. A sensibilidade é algo tão raro nos dias de hoje, talvez porque seja cômodo você deixar de se importar com a dor alheia. A empatia está escassa e faz parte do processo tê-la em abundância. Todo orador precisa ser melindre. Mas um tribuno deve ser ao dobro.




Assim, a sensibilidade nos dias atuais é atributo para poucos e uma peça chave para você ser um tribuno de sucesso. Ela deve ser aguçada pelo defensor, pois defender a liberdade de uma vida em uma realidade onde a Constituição Federal é constantemente afrontada, realidade essa que na prática, parte-se da premissa que o réu sempre será culpado antes de se tornar inocente, exige no mínimo um senso de humanidade aprimorado. O tribuno deve ter a facilidade de perceber e reproduzir sentimentos, pois ele estará lidando com paixões: De um lado, uma família que está em luto porque perdeu um ente querido, do outro... a família que está prestes a perder alguém para a prisão.




É importante estar atento às emoções que permeiam a sociedade, sendo receptível aos sentimentos do auditório. Ser verdadeiro com seus argumentos e acreditar fielmente neles. Para convencer, ele deve estar convencido. Mas cuidado, essa sensibilidade poderá tanto ajudar, quanto afunda-lo, se usada em uma dose excessiva. Existem pessoas que dramatizam demais no júri e acabam caindo no ridículo.




Pois bem, há também alguns atributos objetivos que influenciam no convencimento do conselho de sentença. Um deles é como você se mostrará aos jurados, ou seja, sua apresentação física. O tribuno deve sempre buscar vestir-se adequadamente ao ambiente e plateia a qual irá se dirigir. Assim, ele evitará qualquer tipo de bloqueio dos jurados.

O uso da beca por exemplo, é facultativo. Há regimentos internos de alguns tribunais de justiças que determinam o uso obrigatório das “vestes talares” nos julgamentos por órgão coletivo. Logo, o júri está incluso nessa classificação. Por sua vez, quando não há essa disposição, o tribuno poderá fazer o júri apenas com vestes sociais. Além da apresentação física, deve-se tomar cuidado com o tempo. Não demonstre pressa, tampouco se atrase para a sessão de julgamento.




Outro atributo objetivo é: O tribuno também deve ter posição de ministrante, demonstrando autoridade e excluindo termos informais como “né” ou “eu acho”. Olhe nos olhos dos jurados e se possível, chame-os pelo nome. No mesmo sentido, o advogado deve se preocupar com sua voz. Comunique-se com estilo próprio, alterando o ritmo e o tom de voz de acordo com o que é exposto e evitando sobremaneira a timidez.




Os gestos também são atributos objetivos essenciais para uma boa comunicação e conexão com os jurados. Eles devem ser usados “cum grano salis”, ou seja, com o tempero certo. O tribuno deve saber identificar quais situações será necessário exagerar um pouco na dramatização e quais ele precisará se conter um pouco. Os gestos precedem a fala ou são feitos concomitantemente e sem exageros.




Por fim, a cereja do bolo: O olhar. Ele é uma arma poderosa na persuasão do jurado. A argumentação do tribuno, não é somente oral e gestual. Os olhos também se comunicam, portanto, deve-se atentar e evitar olhares soltos, sendo para o teto, relógio, entre outros. Para prender a atenção de um jurado, você precisa olhar o conselho de sentença nos olhos, com sinceridade, jamais com intimidação. Há técnicas para prender a atenção de um auditório, mas busca-se essencialmente um olhar circular, olha-se antes do discurso de trás pra frente. Separe cerca de 05 segundos antes de começar sua defesa especialmente pra isso. Assim, você chamará a atenção dos jurados de modo que eles não se sintam entediados com seu discurso.




Em conclusão, o tribuno de verdade é diferente do simples advogado falador. Ele se preocupa com os jurados, com a construção do seu discurso. Ele busca crescimento em seus conhecimentos gerais, visando uma melhor performa e persuasão em seu discurso, buscando sempre aprimorar seus atributos subjetivos e objetivos.



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